Especial LOTR - O Retorno do Rei

Escrito por Fábio Rockenbach

( Lord of the Rings - The Return of the King, EUA, 2003 )
Direção de Peter Jackson, com Elijah Wood, Ian McKellen, Viggo Mortensen, Sean Astin, Billy Boyd, Liv Tyler, John Rhys-Davies, Dominic Monaghan, Christopher Lee, Orlando Bloom, Bernard Hill, Miranda Otto, Brad Douriff, Andy Serkis



Enquanto Frodo e Sam adentram em Mordor rumo à Montanha da Perdição, Sauron prepara um ataque derradeiro à Gondor, o grande reino dos Homens. Aragorn, Legolas e Gimli partem para a Senda dos Mortos, buscando o auxílio de um exército que somente o rei de Gondor pode invocar, enquanto Gandalf organiza a defesa de Minas Tirith, esperando pelo socorro de Rohan.

Falar de “O Retorno do Rei”, conclusão da saga do Anel que marcou para sempre um ponto divisor no cinema fantástico é, de certa forma, mencionar superlativos. E, claro, sempre há aqueles que passam a desgostar de um filme exatamente por esses superlativos. Eles indicam, entretanto, que o filme foi êxito, e o público não é tão idiota. Há aqueles sucessos de bilheteria provocados pelo momento, mas que caem no esquecimento tempos depois ( Armageddon foi um sucesso de bilheteria estrondoso, e quem lembra do filme com carinho hoje? ). “O Retorno do Rei” foi um dos únicos três filmes a ultrapassar a barreira do bilhão de dólares em bilheteria, e perde apenas para “Titanic” entre as maiores bilheterias da história. É o maior vencedor da história do Oscar, com 11 estatuetas, ao lado do mesmo Titanic e de Ben Hur. E aos que desdenham de números ligados a bilheteria ou ao comercial Oscar, agüentem: é um triunfo do cinema espetáculo que apresenta o momento máximo da adaptação da mais cultuada obra literária da história. Um dos grandes momentos do cinema como espetáculo em 100 anos.

Jackson, percebe-se, consegue lidar melhor com as várias linhas narrativas, e ao longo da trilogia, elas foram ampliando-se. Aqui, ele consegue unir esses núcleos de forma extremamente satisfatória, sem quedas abruptas em momentos decisivos ou perdas de ritmo que pudessem incomodar o público, como aconteceu em “As Duas Torres”. As mudanças feitas pelo diretor não influenciaram na percepção da estória – apenas senti falta do destino de Saruman, o principal vilão visualizado pelo público nos filmes anteriores, erro que a versão Estendida corrigiu, apesar de que com mudanças. A ausência da seqüência do Expurgo do Condado, por mais que tenha irritado fãs, foi crucial: o final do filme já é longo, com praticamente 3 clímax diferentes, e a seqüência apenas alongaria ainda mais o final dessa estória.

É em “O Retorno do Rei” que todo o cuidado de Jackson com seus personagens, mesmo o secundários, transparece de forma absurda. A preparação citada anteriormente na crítica de “As Duas Torres” é o que possibilita a overdose de emoções que não se restringe aos personagens principais: a estória de Théoden e Eowyn emociona e envolve tanto quanto o drama de Frodo e Sam em Mordor ou a atitude de Aragorn de enfim lutar contra seus demônios e aceitar seu destino como Rei de Gondor. É em “O Retorno do Rei” que as mais de 6 horas anteriores se justificam – e não à toa, Jackson brincou dizendo que “fizemos os dois primeiros filmes para podermos, enfim, filmar “O Retorno do Rei”. È tarefa para poucos: os três filmes apresentaram mais de 100 personagens com falas e cerca de 20 retratados com substância e calma, algo difícil de se encontrar em um mero filme comercial. A agilidade com que o diretor conseguiu editar diversas estórias e fatos acontecendo simultaneamente é de se usar em qualquer aula de edição em cursos de cinema, como exemplo de como manter o fio da meada sem quebrar o ritmo ou descuidar do que, outrora, foi tão importante.

Em “O Retorno do Rei” o diretor abraça, finalmente, toda a mitologia que vinha preparando, fazendo uso inclusive de canções – algo que Tolkien usa e abusa ao longo de toda a narrativa. A seqüência em que Faramir e seus cavaleiros rumam para a morte enquanto Denethor se esbalda em um banquete é um notável exemplo: Pippin canta para o rei uma melodia triste e chora, não apenas por Faramir, mas pela fraqueza que ele enxerga no rei às sua frente, enquanto o monarca se suja com um suco vermelho que simboliza o sangue do próprio filho, sendo derramado em Osgilitah.


A Batalha nos Campos de Pellenor, que toma as telas e a atenção das platéias por longos 40 minutos, é o exemplo máximo a ser copiado e a servir de inspiração no que diz respeito a batalhas em uma tela de cinema. Ela reflete em 40 minutos tudo o que foi planejado, vivido e buscado pelos personagens. É a tour de force da jornada de todas as raças criadas por Tolkien e Jackson faz jus a todo esse significado: ela é insana, violenta, monumental em todas as proporções. Espelha o próprio épico que ele criou, e ainda consegue reunir nessa dezena de minutos momentos notáveis: a chegada dos cavaleiros de Rohan, a carga dos cavaleiros contra o exército de Orcs, o ataque dos Nazgul à Minas Tirith, o avanço dos Olifantes, a célebre luta entre Eowyn e o Nazgul, cantada em verso e prosa por amantes da saga ( e que ganha uma versão fílmica magnífica ), a invasão da grande cidade, e um momento que nunca deveria ter sido removido das versão para os cinemas: o encontro entre Gandalf e o rei Bruxo de Angmar, líder dos Nazgul. É um momento precioso, onde Gandalf é derrotado pelo Nazgul e salvo da morte pela chegada de Rohan a Pelennor- e justifica uma frase que ficou na versão original, onde ele diz ao líder dos Orcs que “cuidará do mago branco”, algo que nunca acontece na versão dos cinemas. Já a seqüência com o "Boca de Sauron" em frente ao Portão Negro, se não é essencial, aprofunda e explica o sentimento de entrega e sacrifício feito por Aragorn e o restante da comitiva quando se dispõem a enfrentar Sauron.

Jackson, todos sabem, é um cineasta inquieto com sua câmera. Gosta de movimentá-la, e isso confere agilidade e grandiosidade aos longos planos que atestam a magnitude da recriação feita pela WETA de tudo o que Tolkien imaginou como sendo a Terra Média. Gimli permanece como o alívio cômico, mas desta vez Jackson soube dosar melhor essa intervenção humorística. A partir de determinado momento, quando as cicatrizes da batalha em Helm’s Deep começam a cicatrizar, ele encara a tarefa de terminar a estória com seriedade. Transparece isso ao mostrar a transfiguração de Frodo – pode-se sentir o peso do fardo que ele carrega, apenas mencionado no primeiro filme e exercitado no segundo, a partir da seqüência dos Pântanos Mortos. Se é o núcleo que menos empolga ao público, a jornada de Frodo e Sam é a essência de tudo o que acontece na trilogia. E ela se justifica em uma cena emocionante: quando Sam diz que não pode carregar o anel, mas pode carregar Frodo. É o resumo do sentimento de abnegação e fidelidade do escudeiro com seu mestre. Sam é, para todos os efeitos, e numa opinião muito particular, o grande herói de saga do Anel. Tolkien reconhece isso, e deixa que ele encerre essa estória, apropriadamente.


A trilha sonora, mantendo a característica das anteriores, continua criando temas únicos para cada filme sem esquecer dos anteriores. Assim, na primeira parte de O Retorno do Rei, temas conhecidos de As Duas Torres continuam ecoando nos ouvidos, principalmente o tema dos cavaleiros de Rohan ( que aparecerá de forma derradeira momentos antes da batalha nos campos de Pelennor).

Existem pequenos deslizes, mas a maior parte deles está no fato de as exigências comerciais forçarem cortes na versão para os cinemas que Jackson, sabidamente, gostaria de não ter feito. Arwen, que era apenas um contraponto romântico à saga, praticamente desaparece neste terceiro filme, justificando sua aparição apenas para pedir ao pai que forje Anduril novamente e a leve a Aragorn. O plot romântico entre Faramir e Eowyn soa artificial na versão estendida - talvez seja o único momento em toda a saga que isso aconteça. E Jackson deixa claro como foi difícil, para ele, encerrar a estória com a qual se identificou tanto durane sete anos. O grande público não entende essa demora em terminar tudo após um clímax eletrizante. Jackson reserva esse direito aos fãs: a seqüência dos Portos Cinzentos é uma das mais belas do cinema, e apresenta também o ponto alto da trilha de Howard Shore. É difícil não se emocionar, mesmo sabendo que Jackson induz essa emoção – e faz isso também para ele, como fã.

Exemplo máximo do cinema como reprodutor de sonhos e mundos impossíveis de existirem, “O Retorno do Rei” é um produto atípico: foi concebido como uma homenagem a uma obra tida como impossível de ser adaptada. Hoje, não é difícil imaginar o filme como um exemplar do cinema fantástico difícil de, um dia, ser batido, porque não se resume à excelência técnica: foi feito a partir de uma estória que, também ela, dificilmente será igualada. As imitações e tentativas que vieram depois exemplificam isso. “O Senhor dos Anéis” é mais do que uma página na história do cinema: ganhou um capítulo só seu, não importa o quanto seus detratores protestem. “Algumas feridas nunca saram”. Para velhos e novos fãs, a saga dos povos da terra média e dos homens do leste contra Sauron é programa para, no mínimo, uma nova visita anual. Longa vida aos DVDs, que propiciam essa passagem de volta no momento em que bem entendermos.

Vídeos

Gandalf enfrenta o Rei-Bruxo de Angmar em Minas Tirith


A Carga dos Rohirrim nos Campos de Pelennor


Eowyn encara o Rei Bruxo


Pippin canta para Denethor enquanto Faramir ruma para a morte


Sam carrega Frodo na Montanha da Perdição


Os Portos Cinzentos



Especial LOTR - Peter Jackson em "O Retorno do Rei"

Escrito por Fábio Rockenbach

Precisei de uma ajuda, mas encontrei: já havia visto as participações especiais de Peter Jackson na sua obra ( foi um cidadão de Bri em “A Sociedade do Anel” e um soldado de Rohan na batalha de Helm’s Deep em “As Duas Torres” ). O ridículo é não ter reparado antes: Jackson faz sua ponta em “O Retorno do Rei”, debaixo de maquiagem, como um o primeiro pirata atingido por Legolas quando a dupla, junto de Aragorn, intercepta os navios que rumam para Gondor.








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Especial LOTR - A Música da Terra Média

Escrito por Fábio Rockenbach

Um apanhado dos melhores momentos do especial The Lord of the Rings Symphony, regido por Howard Shore ( estou atrás deste DVD desesperadamente ). Para relembrar as mais conhecidas melodias da trilogia.

Concerning Hobbits / The Shire


The Bridge of Khaza-Dum


Rohan


Return of the King


The Breaking of Fellowship


The March of Ents


The Grey Havens


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Especial LOTR - As Duas Torres

Escrito por Fábio Rockenbach

( Lord of the Rings - The Two Towers, EUA, 2002 )
Direção de Peter Jackson, com Elijah Wood, Ian McKellen, Viggo Mortensen, Sean Astin, Billy Boyd, Liv Tyler, John Rhys-Davies, Dominic Monaghan, Christopher Lee, Orlando Bloom, Bernard Hill, Miranda Otto, Brad Douriff, Andy Serkis


A Sociedade está desfeita. Enquanto Frodo e Sam rumam para Mordor, encontram Gollum e o tornam seu guia, Aragorn, Legolas e Gimli partem no encalço de Merry e Pippin, seqüestrados pelos Orcs de Saruman. Os três entram em contato com o rei Théoden de Rohan, que está prestes a ser atacado por um exército de 10 mil Orcs e decide esperar pelo inimigo na fortaleza do Abismo de Helm.

PS: As críticas dos filmes são longos mesmo, porque me propus a dissecar vários elementos da adaptação. Leia se quiser ou passe longe...

As Duas Torres é o capítulo do meio de uma longa estória, elemento intermediário, e só isso já ampliaria as dificuldades de sua transposição para as telas. Usualmente, este segundo ato tende a ser, sempre, mais sombrio e pessimista, o que não significa necessariamente que possa perder em qualidade em relação aos demais – vide, por exemplo, o magnífico “O Império Contra-Ataca”, ponto máximo dos seis filmes da série Star Wars. Mas As Duas Torres é, também, um divisor de águas dentro da narrativa da saga do anel, porque em determinado momento, ele proclama uma mudança de rumo e de sentidos na saga.

É a partir de determinado momento, no primeiro terço de As Duas Torres, que “O Senhor dos Anéis” muda drasticamente, porque caracteriza-se pela inserção de um elemento importantíssimo: a entrada dos mundos dos homens na maior saga da Terra Média. Se em todo o primeiro filme – descontando-se a maravilhosa apresentação do condado e o contato com os elfos em Lothlórien – a narrativa é centrada na jornada dos nove integrantes da sociedade do anel, e a preocupação maior é introduzir a cumplicidade dos personagens para com o público, em As Duas Torres toda a linha narrativa torna-se segmentada. Existem 4 acontecimentos paralelos dividindo a atenção do público, e reside na junção desses acontecimentos a maior dificuldade que Peter Jackson encontrou. Temos o núcleo do mal, personificado mais uma vez por Saruman, a jornada de Frodo e Sam rumo a Mordor, a interação de Merry e Pippin com Barbárvore em Fangorn e todo o núcleo de acontecimentos em torno do primeiro reino dos homens a ganhar destaque na estória, envolvendo Aragorn, Legolas, Gimli, Théoden e os cavaleiros de Rohan. Se em “O Retorno do Rei” Jackson alcançou admirável equilíbrio nos cortes entre diferentes núcleos, aqui esses cortes abruptos acabam fragmentando a narrativa. Não que, por exemplo, a diferença de ritmo entre o que acontece no Abismo de Helm e em Fangorn seja culpa do diretor, mas o público sente essa quebra. Se há remédios para alguns males, o remédio para “As Duas Torres” chama-se “Versão Estendida”. Não tente raciocinar demais, é simples: quanto maior o filme – e a versão estendida tem cerca de 50 minutos a mais – melhor é o ritmo, não importa o quão incongruente possa parecer a afirmação.

Se em todo o primeiro filme [...]a narrativa é centrada na jornada dos nove integrantes da sociedade do anel, e a preocupação maior é introduzir a cumplicidade dos personagens para com o público, em As Duas Torres toda a linha narrativa torna-se segmentada.

A começar pela adaptação, foi em “As Duas Torres” que os fãs mais se indignaram com as mudanças propostas por Peter Jackson, principalmente no que diz respeito ao aparecimento de elfos em Helm’s Deep. Não bastasse ser uma heresia a tudo o que Tolkien escreveu, vai contra a própria abertura fantástica do primeiro filme, onde Cate Blanchett narra com voz poderosa que “uma última aliança de homens e elfos marchou contra os exércitos de Mordor”. Mas tudo bem: Jackson queria dar mais destaque à participação dos elfos na estória do Um Anel. O bom é que, menos para aqueles aficcionados fanáticos, essa inserção não traz maiores prejuízos à obra no que se refere à adaptação para o cinema. No que se refere à ação, “As Duas Torres” amplia os sentidos do primeiro filme nos seus 40 minutos finais, e o surgimento dos homens traz junto uma ação mais realista e menos fantástica. O público leigo é que se sentiu prejudicado pelo ritmo lento, mas Jackson deve ter optado por manter o que já havia estabelecido no primeiro filme: ser fiel às descrições e ao universo criado por Tolkien.

No que se refere à ação, “As Duas Torres” amplia os sentidos do primeiro filme nos seus 40 minutos finais, e o surgimento dos homens traz junto uma ação mais realista e menos fantástica.

É aí que entram as cenas deletadas para o cinema e que estão presentes em “As Duas Torres”. É absurdamente incompreensível que as cenas como Denethor, Boromir e Faramir não tenham sido vistas no cinema, porque elas dão base crucial para entender muito do que envolve a relação entre o pai e os dois irmãos, principalmente no último filme. Principalmente para entender porque Faramir está tão obcecado em levar o anel a Gondor. Outros momentos, como a jornada de Frodo, Sam e Gollum, algumas cenas de background entre Arwen e Aragorn e passagens em Osgiliath apenas ajudam a diminuir o impacto dos cortes abruptos. Com mais tempo, os núcleos fazem mais sentido e justificam todo o cuidado na transposição para as telas. Já havia comentado na crítica do primeiro filme de como Jackson trata todos os personagens com um carinho absurdo, inserindo cenas que nas mãos de outro diretor, ou em outro tipo de estórias, seriam descartadas para oferecer mais ação ao público. A cena em que Théoden lamenta a morte do filho para Gandalf é um exemplo. Théoden é um dos personagens dramaticamente mais fortes da trilogia, apesar de ser constantemente alçado a um segundo plano. Rei de um reino decadente, sem herdeiros, enxerga na sobrinha a força que queria para sucedê-lo mas não pode depositar nela essa confiança por ela ser mulher. E constantemente lamenta não estar à altura dos feitos dos antepassados. É uma personagem que nas mãos erradas soaria incrivelmente artificial, mas que Bernard Hill consegue doar contornos realistas. É com Théoden que pode-se exemplificar a preocupação de Peter Jackson com a fidelidade do espírito da obra, em cenas que num outro filme passariam rasas, ou sequer seriam filmadas, em prol da ação. A cena em frente ao túmulo do filho seria dispensável para a condução da estória, mas é crucial para que comecemos a entender a decepção do rei de Rohan por não estar à altura dos seus antepassados. Esse sentimento é indispensável para alcançar todo o sentimento que transborda no último filme, principalmente na relação entre ele e Eowyn.

É com Théoden que pode-se exemplificar a preocupação de Peter Jackson com a fidelidade do espírito da obra, em cenas que num outro filme passariam rasas, ou sequer seriam filmadas, em prol da ação. A cena em frente ao túmulo do filho seria dispensável para a condução da estória, mas é crucial para que comecemos a entender a decepção do rei de Rohan por não estar à altura dos seus antepassados.

E Miranda Otto é outro fruto do filme. Insere vida em uma estória que dá pouco espaço às mulheres – se Arwen não tivesse sua estória ampliada dos escritos complementares de Tolkien, Eowyn seria a única mulher a ter algum destaque nessa estória, fruto talvez da época e da sociedade em que a saga foi escrita na primeira metade do século XX. E Miranda Otto, de grandes olhos emanando sentimentos, justifica boa parte da atração que o núcleo de Rohan desperta.

E mesmo que Barbárvore seja um ótimo exemplo do poder de criação da WETA Digital combinada com a arte de Alan Lee, é em Gollum que reside um dos grandes feitos da trilogia. Os méritos, claro, vão para os técnicos da WETA, mas acima de tudo vão para Andy Serkis, já que todos os movimentos desse ser patético e estranhamente provocador de pena são obra de Serkis. É um personagem trágico, dividido entre duas personalidades e conduzido pela obsessão ao anel. Talvez seja a maior criação do universo literário de Tolkien.

Repetindo a crítica do primeiro filme: As Duas Torres funciona em si mesmo, mas é preciso ser visto como a metade de um longo filme de 12 horas. Nesse sentido, é um primor, porque desenvolve os personagens do filme anterior, apresenta novos núcleos e consegue, em apenas um filme, nos tornar cúmplices dos novos personagens da saga. Abre mão de apressar certas estórias e, ainda que apresente problemas nos cortes entre os núcleos, prepara de forma admirável o público para o clímax da série sem se descuidar da maior façanha do diretor: um respeito quase sagrado ao que está transpondo para a tela.

PS: Um certo crítico detonou a trilha sonora, dizendo que ela era mais do mesmo. Respeitosamente, discordo, seguindo na mesma linha do que escrevi para o primeiro filme: Howard Shore fez uma obra-prima. O mais do mesmo é uma menção tímida à trilha que se ouvia no primeiro filme, na verdade, como um elemento de ligação. Em determinado momento, a trilha de As Duas Torres ganha personalidade própria, com a inserção do núcleo de Rohan – uma melodia que é quase um lamento, facilmente identificável como o grande tema do segundo filme. E Shore fará o mesmo com o terceiro filme, criando uma transição gradual e lenta, concebendo os três filmes como um só. Bom que Howard Shore entendeu que é esse o espírito, ao contrário de muita gente “entendida” que analisa os filmes apenas separadamente.

PS2: Uma homenagem: Jackson deixou de fora do primeiro filme a seqüência em que os hobbits são engolidos pelo velho carvalho e são salvos por Tom Bombadil. Na versão estendida de As Duas Torres, é feita uma menção à essa cena, usando Merry, Pippin e Barbárvore em Fangorn. Trata-se de uma pequena homenagem para lembrar toda uma seqüência que os fãs gostariam de ter visto nos filmes mas não puderam. Em outro local e com outros protagonistas, mas a menção vale, e muito.

Especial LOTR - A Sociedade do Anel

Escrito por Fábio Rockenbach

( Lord of the Rings - The Fellowship of the Ring, EUA, 2001 )
Direção de Peter Jackson, com Elijah Wood, Ian McKellen, Viggo Mortensen, Sean Astin, Billy Boyd, Liv Tyler, John Rhys-Davies, Dominic Monaghan, Christopher Lee, Ian Holm, Orlando Bloom


Uma comitiva de povos da Terra Média (4 hobbits, dois homens, um mago, um anão e um elfo) precisa destruir um anel que é a fonte de poder do senhor do mal, Sauron, que depois de milênios começa a ressurgir. O anel só pode ser destruído no local onde ele foi forjado, a Montanha da Perdição, no meio do território governado por Sauron.


Mais de um ano antes de ser lançado nos cinemas, os primeiros rumores sobre a adaptação para os cinemas de “O Senhor dos Anéis” apontava o diretor de “Os Espíritos” como responsável pela empreitada, e afirmava que possivelmente seriam dois filmes condensando os três livros. Especulava-se Sean Connery para viver Gandalf. Tremi nas bases, primeiro lembrando da adaptação animada de Ralph Bashki feita em duas partes no final dos anos 70, e depois imaginando o sotaque escocês de Connery como Gandalf. Alguns meses depois um teaser falando sobre a concepção da obra e as primeiras imagens me deixaram mais tranqüilo e ao mesmo tempo afoito: O Senhor dos Anéis, ao que parecia, seria tudo o que eu poderia imaginar, principalmente porque havia a confirmação da presença do ilustrador Alan Lee na produção – conseqüentemente, minha visão preferida da obra deveria ser vista nas telas.

Dezembro de 2001 foi a apoteose para qualquer fã da obra de Tolkien, cultuada há meio século, porque pela primeira vez uma superprodução dedicava atenção, respeito e tecnologia para dar vida a uma obra que era considerada infilmável. “O Senhor dos Anéis – A Sociedade do Anel” tinha dois objetivos diretos quando foi lançado naquele ano: satisfazer os exigentes e fanáticos seguidores da obra e apresentá-la a quem não a conhecia, ou apenas a ligava a jogos de RPG. Conseguiu alcançar ambos os objetivos: choveram críticas de quem considerava o filme fútil, confuso e sem ritmo, e como de praxe, aqueles que passaram a odiá-lo devido à toda a badalação e o sucesso. Azar deles: A Sociedade do Anel apresenta um mundo fantástico com pompa e circunstância e, desde seu lançamento, inaugurou uma daquelas famosas eras de “antes” e “depois” no que diz respeito a épicos e fantasias no cinema. A seqüência em Moria - e particularmente a luta entre Gandalf e o Balrog - é um momento que eterniza essa afirmação.





SEM DIDATISMO, JACKSON PROVOCA A CURIOSIDADE DO LEIGO
Os primeiros cinco minutos da fantasia correspondem, provavelmente, a um dos melhores inícios – e um dos mais competentes exercícios de síntese já vistos – ao apresentar a mitologia em torno dos anéis do poder, a história de Sauron, sua queda, a traição de Isildur, o desaparecimento do anel e como ele foi parar no condado. Em apenas 5 minutos, e de uma forma que não deixa os leigos perdidos. Ao cabo desses cinco minutos, “A Sociedade do Anel” já fisgou seu público. Jackson começa, desde esse momento, a apresentar duas características marcantes da trilogia: movimentos de câmera fenomenais e a presença constante - constante mesmo - da música ao longo de todo o filme ( praticamente não existem cenas sem trilha sonora ). E é um filme notavelmente diferente dos seus sucessores. Aqui, Peter Jackson tinha a necessidade de apresentar personagens e mitologia, porque precisava pensar no filme como uma criação separada da literatura e, assim, perfeitamente inteligível. Adequadamente, ele optou por não fazer didatismos. Não tenta explicar os conceitos das raças de uma maneira didática, mas joga, aqui e ali, elementos nas frases dos personagens que começam a construir o sentido do mundo imaginado por Tolkien e suas raças. Jackson confiou que aqueles que não conheciam a mitologia acabariam se interessando por elas, e fez bem. Não foram poucas as pessoas que adotaram os livros após a experiência cinematográfica. Esse efeito foi conseguido sem que houvesse detrimento de entendimento da história. De forma lenta, os personagens começam a ser desenvolvidos de uma forma que fará sentido ao se completar o ciclo: entenda O Senhor dos Anéis não como três filmes, mas uma longa produção ( que é melhor com quase 12 horas na versão estendida ). Assim, a lenta mudança de comportamento, ânimo e aparência dos Hobbits é balizada, também, pela maneira como Gandalf mudará ao longo da jornada ( repare a reverência com que ele encara Saruman quando se encontram pela primeira vez ).



CENTRALIZAÇÃO DA NARRATIVA CRIA LAÇOS
A estrutura de “A Sociedade do Anel” é dividida em dois focos narrativos, e dois momentos: o primeiro foco corresponde aos personagens da sociedade em si, especificamente Frodo, Sam e Gandalf num primeiro momento.os demais integrantes depois, e o outro foco é o “eixo do mal” representado por Saruman. E ao longo da narrativa, mesmo com a presença de diferentes raças, é como se a Terra Média fosse povoada apenas pelos membros da sociedade e os orcs que os caçam. Essa centralização na figura dos nove integrantes é importante para que se estabeleça uma relação próxima entre eles e a platéia ( algo que Tolkien sabia muito bem e fez também nos livros ). Vagarosamente, novos elementos começam a surgir – os elfos em Lórien, especificamente. “A Sociedade do Anel” representa, assim, a apresentação aos personagens, ao mundo e ao plot que guia a jornada pela destruição do Um Anel.

Jackson, obviamente, promoveu alterações no roteiro para se adequar ao cinema. A jornada dos Hobbits à Bri ficou menor, e foi retirada toda a parte em que eles interagem com Tom Bombadil, um personagem amado pelos fãs. Outros núcleos foram ampliados, e Arwen, personagem de Liv Tyler, ampliou sua importância – não é ela quem salva Frodo dos Nazgul e faz erguerem-se as águas no livro. Já o background envolvendo Aragorn e Arwen, que ganha imenso destaque nos filmes, é uma maneira de Jackson recuperar uma estória amada pelos fãs mas que não deverá surgir em filmes, envolvendo Lúthien e Beren, uma elfa e um homem que se apaixonam ( estória presente em "O Sillmarilion" ) além, é claro, de criar um interesse romântico na saga que atraia parte do público. Sinceramente não me incomoda - e pior seria se Jackson inventasse essa relação. Não vou me demorar em mencionar as chacotas em torno da relação de Frodo e Sam. Jackson manteve o texto original de Tolkien, escrito nos meios acadêmicos antes da metade do século passado, para vários personagens, inclusive muitos diálogos da relação imaginada como servil e de devoção de Sam para Frodo ( nada mais normal para um inglês acostumado a esse tipo de relação em uma sociedade conservadora ). Se em vez de dizer “Oh Sam” ( como está nos livros escritos naquela época ) Frodo dissesse “Pô Sam, foi mal cara, me desculpe.” muita gente faria menos chacota. Eu, sinceramente, não ligo porque sei como isso está descrito nos livros.



UMA TRILHA PARA 12 HORAS DE FILME
O compositor Howard Shore, por sua vez, começa a criar a obra de sua vida ao fazer, para os três filmes, uma identidade própria, usando de um tema principal constante e variações que definem cada povo ou jornada. No primeiro filme, o tema da sociedade alternava-se ( depois da introdução da tocante "Concerning Hobbits" no Condado) com o tema dos Orcs e de Saruman, este muito mais tocado - e o épice é o coral de vozes cantando em "The Bridge of Kaza-Dhum", na sequência imediatamente anterior ( e imediatamente posterior de forma melancólica ) ao confronto entre Gandalf e o Balrog - os elfos de Lórien ganham uma trilha com coral que se casa perfeitamente à raça criada por Tolkien. Timidamente, Jackson também insinua-se nas canções que Tolkien espalha em sua obra – e que legitimam o universo que ele cria. Na versão estendida, uma bela cena apresenta Aragorn cantando uma canção em élfico que encanta Frodo. É uma pena que a cena não exista também na versão para os cinemas. A rigor, a versão estendida não altera o entendimento da história – diferente de “As Duas Torres, por exemplo – mas amplia o mergulho em toda a mitologia de Tolkien. Todos deveriam ver essa versão para esse mergulho ser profundo. O condado, os hobbits e seus hábitos são apresentados com detalhes em uma bela seqüência inicial, os hobbits vêem elfos na floresta rumando aos portos cinzentos, o coração de Lórien é mostrado e os presentes de Galadriel à comitiva merece atenção especial. São cenas que complementam uma obra já marcante na história do cinema.

Concerning Hobbits - na versão extendida, a apresentação dos hobbits logo após o prólogo


O prólogo, na versão estendida


Gandalf e o Balrog - versão editada por um fã, unindo as cenas do segundo filme.



Especial LOTR - Alan Lee e o visual da saga...

Escrito por Fábio Rockenbach

Especial - O Senhor dos Anéis - Parte 4 - A influência de Alan Lee no visual da trilogia.

Para não alongar este post - haverá outro apenas para Alan Lee - basta dizer que o mais famoso ilustrador de Tolkien é um dos responsáveis pela magia da trilogia no cinema. Sua visão das descrições do autor foram a base das adaptações - ele foi consultor do filme para cenários e figurinos. Algumas de suas ilustrações foram a base para o desenvolvimento de várias cenas. Para comprovar, basta clicar nas imagens abaixo e ampliá-las, comparando as ilustrações com os filmes. Mais abaixo, as legendas das imagens, todas elas criadas décadas antes dos filmes.

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1. Rivendell ( Valfenda ), lar de Elrond. Na cena do filme, a partida da sociedade rumo à Mordor.
2. Os portões de Moria.
3. O interior de Moria. Desenho de produção fiel à interpretação de Alan Lee da descrição de Tolkien.
4. Frodo, Sam e Gollum em frente ao Portão Negro. A cena é igual à ilustração, inclusive no ângulo em que foi filmada.
5. Gollum é capturado por Sam e Frodo. Sem comentários...
6. A árvore branca de Gondor. No filme, na cena em que Gandalg e Pippin saem após conversarem com Denethor.
7. Frodo e Shelob. A aranha não aparece no frame capturado do filme ( ela está sobre Frodo ). o cenário e a composição são iguais aos imaginados por Lee.
8. Mintas Tirith. Composição fidelíssima à que Alan Lee teve - Nasmith tem um desenho muito semelhante da cidade dos Homens.
9. Isengard. Não encontrei nenhuma cena que mostrasse toda a torre - ela é altíssima - mas quem conhece os filmes vai reconhecer facilmente como ela foi imaginada por Lee décadas antes dos filmes.
10. O Abismo de Helm. Toda a cena, os cenários, as proporções... tudo foi desenhado por Lee e retratado fielmente por Jackson.

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Especial LOTR - Mania de Hitchcok

Escrito por Fábio Rockenbach

Especial O Senhor dos Anéis - Parte 3 - Peter Jackson e suas pontas na trilogia.

É, não é apenas Hitchcok e Shyamalan que gostam de aparecer em seus filmes. Fã declarado de Lord of the Rings, Peter Jackson também deu um jeito de aparecer nos filmes. Encontrei ele duas vezes,, uma em A Sociedade do Anel, e outra em As Duas Torres. É provável que ele também apareça em O Retorno do Rei. Só é preciso vasculhar - não percebi, mas também não tinha percebido a ponta dele no segundo filme até assistir de novo neste final de semana.

Em A Sociedade do Anel
Os hobbits chegam a Bri para encontrar Gandalf no Pônei Saltitante. Ao entrarem na cidade, dão de cara com tipos mal encarados embaixo da chuva. Jackson aparece inconfundível debaixo de chuva, com cara de mau. ( clique para ampliar )
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Em As Duas Torres
Os Orcs fazem a primeira investida contra o portão principal. Théoden ordena que segurem a porta e impeçam a invasão. Crianças e soldados começam a soltar pedras sobre os Orcs. Jackson entre eles, de armadura e tudo...
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Especial LOTR - Ilustradores: Ted Nasmith

Escrito por Fábio Rockenbach

Especial "O Senhor dos Anéis" parte 2: a influência do desenho de Ted Nasmith na concepção de Alan Lee e do filme

Texto: acréscimos do blog a um texto original de Daniel De Boni

Foram Alan Lee e John Howe, principalmente Lee, os nomes que mais influenciaram a produção dos três filmes na criação de cenários, figurinos e mesmo cenas – o que poderá ser comprovado em breve com um post comparativo de cenas e pinturas feitas por Lee com anos de antecedência. Mas também é impressionante como a visão de Lee e de Ted Nasmith se assemelha. Se Nasmith não foi consultor do filme, sua visão influenciou muito o diretor Peter Jackson – como as imagens postadas abaixo poderão mostrar, para quem lembrar do filme. Não é mera coinscidência: Nasmith é um dos mais idolatrados ilustradores de Tolkien há mais de 30 anos.

Após ter lido O Senhor dos Anéis na década de 70 como estudante de arte quando ainda era bastante jovem, Ted Nasmith se tornou um apaixonado pela literatura Tolkineana. Isso ocorreu ainda antes de iniciar sua carreira como ilustrador. Ainda se passariam vários anos antes de começar a fazer ilustrações baseadas no Hobbit, no Senhor dos Anéis e no Silmarillion. Porém antes disso seu trabalho já era reconhecido na área de desenhos arquitetônicos, onde sua arte surrealística e sua grande dedicação arrebatavam elogios. Durante algum tempo ele dividiu seu trabalho entre a arte arquitetônica e Tolkien, além de outros tipos de ilustração, mas a Terra-média sempre foi à influência predominante da sua carreira.

Com dezenas de ilustrações de alta qualidade, Nasmith ganhou uma sólida reputação entre os fãs de Tolkien, e teve seu trabalho publicado em vários calendários e livros ao longo dos anos. Recentemente ilustrou sozinho uma edição comemorativa do Silmarillion, uma honra singular. Além do prazer complementar de trazer ao mundo visões da Terra-média, Ted Nasmith vê a sua arte como uma ponte que une dois reinos distantes, o nosso próprio mundo e Arda, o mundo criado por Tolkien, que não é outro mundo, mas apenas o nosso próprio em um período muito longínquo de tempo... milhares de anos atrás.

Conheça algumas das pinturas de Nasmith que influenciaram na produção ( clique para ampliar )

A Sociedade do Anel é emboscada na passagem de Caradhras
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A Fuga de Gandalf de Isengard

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Os Ents atacam Isengard

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Gandalf e as águias resgatam Sam e Frodo na Montanha da PerdiçãoPhotobucket

O adeus nos Portos Cinzentos
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Frodo e Gollum na Montanha da Perdição
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Veja a galeria completa de Ted Nasmith aqui
http://www.duvendor.com.br/galeria/thumbnails.php?album=4

Especial LOTR - A Idolatria por uma obra superior...

Escrito por Fábio Rockenbach

Especial "O Senhor dos Anéis - Parte 1": explicando a importância da obra literária e o respeito da adaptação com os fãs

É um prodígio constatar o respeito quase sagrado com que Peter Jackson tratou a adaptação para os cinemas de “O Senhor dos Anéis”. Para quem conheceu a obra somente a partir da repercussão das adaptações para o cinema, existe uma ausência de um background que explica essa reverência. Sempre fui um defensor de que as versões para o cinema sobrevivem sozinhas – eis porque também defendo as alterações feitas na adaptação – mas também sou um defensor ferrenho de que saboreia muito mais as três obras quem conhece Tolkien, quem as conheceu antes sequer dos filmes serem anunciados e saciava seus desejos da Terra Média observando os desenhos de Alan Lee, dos irmãos Hildebrandt, Ted Nasmith, John Howe e Angus Mc Bride. Esses fãs, que dessa forma mantiveram acesa a chama da obra, recebem nos filmes um presente especial.


Antes de mais nada, muita gente não entende a idolatria em torno da obra de Tolkien. Falta para muita gente esse conhecimento. “O Senhor dos Anéis” foi eleito o livro do século na Grã-Bretanha. Em números absolutos, só um livro no ocidente foi mais lido do que ele, a Bíblia. A trilogia do anel é o ponto máximo de uma obra que é absurdamente fabulosa. J.R.R. Tolkien, seu criador, notabilizou-se como lingüista, contemporâneo de C.S. Lewis e outros gênos. Lecionou em Oxford, e através de sua paixão por línguas antigas concebeu um universo fantástico. A rigor, considere que O Senhor dos Anéis só existe pela paixão de Tolkien pela lingüística. Encare assim: Tolkien criou línguas com uma estrutura gramatical perfeita: criou os símbolos que representam as letras, criou a fonética, definiu a gramática e até mesmo as exceções gramaticais. O Sindarin, as runas dos anões, a língua élfica, as línguas de vários povos que formam o background da trilogia foram criadas de forma perfeita por Tolkien – a tal ponto que existem comunidades na Inglaterra que falam entre si em élfico – mas para dar um sentido a essas línguas, Tolkien precisava de um mundo. Criou a Terra Média, fez um mapa de suas terras e acidentes geográficos, cada qual com sua particularidade.

E como todo mundo precisa de sentido, criou sua história e seus habitantes, desde o aspecto mitológico – os deuses que criaram a Terra Média – dividindo sua história em 3 eras. É como se a obra de Tolkien fosse o Antigo Testamento e o Novo Testamento da Terra Média. E esse mundo é completo: geograficamente, historicamente e linguisticamente. É a obra de uma vida, espalhada em diversos livros principais( O Silmarillion – o “Velho Testamento” da obra -, Contos Inacabados da Terra Média, O Hobbit, O Senhor dos Anéis... ) com outros complementares – como é o caso de As Aventuras de Tom Bombadil.

Esse processo começou nas trincheiras da primeira guerra mundial, quando esboçou o que seria O Senhor dos Anéis, mas começou com O Hobbit, aventura infanto-juvenil lançada pouco depois que fez enorme sucesso. Os apelos para uma continuação deram origem a “O Senhor dos Anéis” uma obra mais robusta, sombria e pesada, que só seria concluída na metade da década de 50. De lá até 2001, “O Senhor dos Anéis” manteve o posto de obra mais idolatrada da literatura mundial, e a referência para tudo o que se ouvia falar de mitologia: o mago de barbas brancas, trolls, elfos, dragões, anões, paladinos... enfim, todo o universo de aventuras de capa-e-espada e RPG. Não por acaso, a obra de Tolkien foi uma das maiores inspiradoras para George Lucas criar “Star Wars”, espécie de substituto futurista da mitologia de Tolkien. E Tolkien foi inspiração para que CS Lewis criasse “AS Crônicas de Nárnia”.

Quando me refiro ao respeito com que Jackson trata os fãs me refiro à maneira como ele traz vida e mostra aos fãs – como ele, um fã declarado da obra – a sua interpretação. Durante décadas, o mundo de Tolkien foi visto e discutido por artistas e fãs, baseado nas descrições detalhadas que Tolkein dava em seus livros. É por isso que, quando entra na casa de Frodo pela primeira vez, Gandalf dirige-se à sala e a câmera movimenta-se de cima abaixo de forma reverenciosa. É Jackson mostrando com detalhes, e com calma, a casa em Bolsão que durante mais de 40 anos só foi imaginada e vista em desenhos pelos fãs. É por isso que ele desvenda, lentamente, os caminhos, colinas e pequenos cantos do Condado quando Gandalf entra por ele no começo do primeiro filme – porque a visão do condado era algo que pertencia a cada fã, baseado na criação muito particular de Tolkien. É por isso que ele faz questão de dar um close em Isengard antes de desviar a câmera para Gandalf e Saruman em seu primeiro encontro: porque a Isengard que está ali foi imortalizada nos desenhos de Alan Lee durante décadas, e é prontamente reconhecida pelos fãs.

Esse texto é apenas uma introdução. Não tenho a bagagem literária – apesar de ter liso a obra duas vezes – para introduzir o universo de Tolkien. Queria apenas provocar quem não entende toda a louvação em torno de filmes e obras, de que há um imenso universo por trás das 12 horas de filmes vistas nos cinemas, ou mesmo além das milhares de páginas do livro. Um bom passo inicial para conhecer isso é conhecer os artistas que representaram Tolkien para o mundo por décadas. É o assunto do próximo post ( em meio aos posts, estou absorto em uma maratona de 16 horas de filme. Para quem já assistiu, é a melhor forma de entender e sentir novamente toda a carga de emoção e magia imposta por Jackson, bem como sentir melhor a diferença entre os filmes. Até a segunda, devo terminar ela... )

Para quem quiser saber mais sobre Tolkien
http://pt.wikipedia.org/wiki/Categoria:Tolkien
http://duvendor.com.br/
http://www.valinor.com.br/



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