Especial LOTR - A Sociedade do Anel

Escrito por Fábio Rockenbach

( Lord of the Rings - The Fellowship of the Ring, EUA, 2001 )
Direção de Peter Jackson, com Elijah Wood, Ian McKellen, Viggo Mortensen, Sean Astin, Billy Boyd, Liv Tyler, John Rhys-Davies, Dominic Monaghan, Christopher Lee, Ian Holm, Orlando Bloom


Uma comitiva de povos da Terra Média (4 hobbits, dois homens, um mago, um anão e um elfo) precisa destruir um anel que é a fonte de poder do senhor do mal, Sauron, que depois de milênios começa a ressurgir. O anel só pode ser destruído no local onde ele foi forjado, a Montanha da Perdição, no meio do território governado por Sauron.


Mais de um ano antes de ser lançado nos cinemas, os primeiros rumores sobre a adaptação para os cinemas de “O Senhor dos Anéis” apontava o diretor de “Os Espíritos” como responsável pela empreitada, e afirmava que possivelmente seriam dois filmes condensando os três livros. Especulava-se Sean Connery para viver Gandalf. Tremi nas bases, primeiro lembrando da adaptação animada de Ralph Bashki feita em duas partes no final dos anos 70, e depois imaginando o sotaque escocês de Connery como Gandalf. Alguns meses depois um teaser falando sobre a concepção da obra e as primeiras imagens me deixaram mais tranqüilo e ao mesmo tempo afoito: O Senhor dos Anéis, ao que parecia, seria tudo o que eu poderia imaginar, principalmente porque havia a confirmação da presença do ilustrador Alan Lee na produção – conseqüentemente, minha visão preferida da obra deveria ser vista nas telas.

Dezembro de 2001 foi a apoteose para qualquer fã da obra de Tolkien, cultuada há meio século, porque pela primeira vez uma superprodução dedicava atenção, respeito e tecnologia para dar vida a uma obra que era considerada infilmável. “O Senhor dos Anéis – A Sociedade do Anel” tinha dois objetivos diretos quando foi lançado naquele ano: satisfazer os exigentes e fanáticos seguidores da obra e apresentá-la a quem não a conhecia, ou apenas a ligava a jogos de RPG. Conseguiu alcançar ambos os objetivos: choveram críticas de quem considerava o filme fútil, confuso e sem ritmo, e como de praxe, aqueles que passaram a odiá-lo devido à toda a badalação e o sucesso. Azar deles: A Sociedade do Anel apresenta um mundo fantástico com pompa e circunstância e, desde seu lançamento, inaugurou uma daquelas famosas eras de “antes” e “depois” no que diz respeito a épicos e fantasias no cinema. A seqüência em Moria - e particularmente a luta entre Gandalf e o Balrog - é um momento que eterniza essa afirmação.





SEM DIDATISMO, JACKSON PROVOCA A CURIOSIDADE DO LEIGO
Os primeiros cinco minutos da fantasia correspondem, provavelmente, a um dos melhores inícios – e um dos mais competentes exercícios de síntese já vistos – ao apresentar a mitologia em torno dos anéis do poder, a história de Sauron, sua queda, a traição de Isildur, o desaparecimento do anel e como ele foi parar no condado. Em apenas 5 minutos, e de uma forma que não deixa os leigos perdidos. Ao cabo desses cinco minutos, “A Sociedade do Anel” já fisgou seu público. Jackson começa, desde esse momento, a apresentar duas características marcantes da trilogia: movimentos de câmera fenomenais e a presença constante - constante mesmo - da música ao longo de todo o filme ( praticamente não existem cenas sem trilha sonora ). E é um filme notavelmente diferente dos seus sucessores. Aqui, Peter Jackson tinha a necessidade de apresentar personagens e mitologia, porque precisava pensar no filme como uma criação separada da literatura e, assim, perfeitamente inteligível. Adequadamente, ele optou por não fazer didatismos. Não tenta explicar os conceitos das raças de uma maneira didática, mas joga, aqui e ali, elementos nas frases dos personagens que começam a construir o sentido do mundo imaginado por Tolkien e suas raças. Jackson confiou que aqueles que não conheciam a mitologia acabariam se interessando por elas, e fez bem. Não foram poucas as pessoas que adotaram os livros após a experiência cinematográfica. Esse efeito foi conseguido sem que houvesse detrimento de entendimento da história. De forma lenta, os personagens começam a ser desenvolvidos de uma forma que fará sentido ao se completar o ciclo: entenda O Senhor dos Anéis não como três filmes, mas uma longa produção ( que é melhor com quase 12 horas na versão estendida ). Assim, a lenta mudança de comportamento, ânimo e aparência dos Hobbits é balizada, também, pela maneira como Gandalf mudará ao longo da jornada ( repare a reverência com que ele encara Saruman quando se encontram pela primeira vez ).



CENTRALIZAÇÃO DA NARRATIVA CRIA LAÇOS
A estrutura de “A Sociedade do Anel” é dividida em dois focos narrativos, e dois momentos: o primeiro foco corresponde aos personagens da sociedade em si, especificamente Frodo, Sam e Gandalf num primeiro momento.os demais integrantes depois, e o outro foco é o “eixo do mal” representado por Saruman. E ao longo da narrativa, mesmo com a presença de diferentes raças, é como se a Terra Média fosse povoada apenas pelos membros da sociedade e os orcs que os caçam. Essa centralização na figura dos nove integrantes é importante para que se estabeleça uma relação próxima entre eles e a platéia ( algo que Tolkien sabia muito bem e fez também nos livros ). Vagarosamente, novos elementos começam a surgir – os elfos em Lórien, especificamente. “A Sociedade do Anel” representa, assim, a apresentação aos personagens, ao mundo e ao plot que guia a jornada pela destruição do Um Anel.

Jackson, obviamente, promoveu alterações no roteiro para se adequar ao cinema. A jornada dos Hobbits à Bri ficou menor, e foi retirada toda a parte em que eles interagem com Tom Bombadil, um personagem amado pelos fãs. Outros núcleos foram ampliados, e Arwen, personagem de Liv Tyler, ampliou sua importância – não é ela quem salva Frodo dos Nazgul e faz erguerem-se as águas no livro. Já o background envolvendo Aragorn e Arwen, que ganha imenso destaque nos filmes, é uma maneira de Jackson recuperar uma estória amada pelos fãs mas que não deverá surgir em filmes, envolvendo Lúthien e Beren, uma elfa e um homem que se apaixonam ( estória presente em "O Sillmarilion" ) além, é claro, de criar um interesse romântico na saga que atraia parte do público. Sinceramente não me incomoda - e pior seria se Jackson inventasse essa relação. Não vou me demorar em mencionar as chacotas em torno da relação de Frodo e Sam. Jackson manteve o texto original de Tolkien, escrito nos meios acadêmicos antes da metade do século passado, para vários personagens, inclusive muitos diálogos da relação imaginada como servil e de devoção de Sam para Frodo ( nada mais normal para um inglês acostumado a esse tipo de relação em uma sociedade conservadora ). Se em vez de dizer “Oh Sam” ( como está nos livros escritos naquela época ) Frodo dissesse “Pô Sam, foi mal cara, me desculpe.” muita gente faria menos chacota. Eu, sinceramente, não ligo porque sei como isso está descrito nos livros.



UMA TRILHA PARA 12 HORAS DE FILME
O compositor Howard Shore, por sua vez, começa a criar a obra de sua vida ao fazer, para os três filmes, uma identidade própria, usando de um tema principal constante e variações que definem cada povo ou jornada. No primeiro filme, o tema da sociedade alternava-se ( depois da introdução da tocante "Concerning Hobbits" no Condado) com o tema dos Orcs e de Saruman, este muito mais tocado - e o épice é o coral de vozes cantando em "The Bridge of Kaza-Dhum", na sequência imediatamente anterior ( e imediatamente posterior de forma melancólica ) ao confronto entre Gandalf e o Balrog - os elfos de Lórien ganham uma trilha com coral que se casa perfeitamente à raça criada por Tolkien. Timidamente, Jackson também insinua-se nas canções que Tolkien espalha em sua obra – e que legitimam o universo que ele cria. Na versão estendida, uma bela cena apresenta Aragorn cantando uma canção em élfico que encanta Frodo. É uma pena que a cena não exista também na versão para os cinemas. A rigor, a versão estendida não altera o entendimento da história – diferente de “As Duas Torres, por exemplo – mas amplia o mergulho em toda a mitologia de Tolkien. Todos deveriam ver essa versão para esse mergulho ser profundo. O condado, os hobbits e seus hábitos são apresentados com detalhes em uma bela seqüência inicial, os hobbits vêem elfos na floresta rumando aos portos cinzentos, o coração de Lórien é mostrado e os presentes de Galadriel à comitiva merece atenção especial. São cenas que complementam uma obra já marcante na história do cinema.

Concerning Hobbits - na versão extendida, a apresentação dos hobbits logo após o prólogo


O prólogo, na versão estendida


Gandalf e o Balrog - versão editada por um fã, unindo as cenas do segundo filme.



9 Comentários:

  1. Jacques disse...

    Peter Jackson conseguiu a quase impossível missão de transpor o universo de Talkien para a telona. Um filme poderoso e mágico. Creio ser o melhor da trilogia. Gostei do blog. Já tá adicionado. Abcs.

  2. pseudo-autor disse...

    Apesar de alguns deslizes na segunda parte (As Duas Torres), Jackson mostrou de forma contundente o que é adaptar um obra gloriosa de forma competente. Não fosse a arrogância e a falta de profissionalismo da Time Warner, ele poderia estar à frente também de O Hobbit. O que é uma pena para os fãs da obra de Tolkien!

    Discutir a Mídia?
    http://robertoqueiroz.wordpress.com

  3. Anônimo disse...

    Fábio,
    você merece muitos parabéns por comentar um filme como esse. Eu, sinceramente, tenho medo de nunca conseguir sintetizar o que esse filme significou para mim.
    Você tem toda razão ao dizer que todos deveriam ver as versões estendidas. As cenas acrescentadas não perdem em nada. Na verdade, enriquecem e muito o filme.
    E algumas cenas dos filmes seguintes (como o flashback de Faramir, Boromir e Denethor, que explicaria, no filme, toda aquela vontade de Faramir para com o Anel, que não existe assim nos livros) fazem mais diferença ainda. A cena é explicativa, e faz muito sentido no filme.
    Amo as versões estendidas. Tenho aqui em casa e não largo por nada. E você, com seu Especial Senhor dos Anéis, está me enchendo de vontade de assistir de novo!

    Abraços! E continue o bom trabalho =)

  4. Pedro Henrique Gomes disse...

    Será que só eu não acho essa trilogia tão fantástica?

    Abraço!!!

  5. Fábio Rockenbach disse...

    O que mais tem levado tempo é justamente a crítica dos filmes, porque demorei muito tempo até decidir me arriscar a fazer isso - e eu sabia que não conseguiria escrever pouco sobre o assunto, mas não poderia justamente por isso soar chato. O texto de As Duas Torres está na mão, e tenho outros 3 posts complementares. Acho que o especial dura ainda uns 10 dias.

  6. Anônimo disse...

    Fábio! Saiu o Especial do Kubrick lá no multiplot!, passa lá.

  7. Isabela disse...

    Senhor dos Aneis que tinha tudo para ser um filme apenas para nerds e simpatizantes, acabou se tornando uma obra prima, pela genialidade do diretor, o roteiro muito bem feito, e o grande elenco. Grande em talento e numero.

  8. Diego Rodrigues disse...

    Adoro este filme, para mim um dos melhores dos anos 2000.

    Peter Jackson fez mágica e conduziu comuma maestria inigualável uma trilogia que, sem dúvidas, é uma das melhores já feitas para o Cinena.

  9. Robson Saldanha disse...

    Pra mim é bem dificil classificar qual dos três é o melhor em O Senhor dos Anéis. O Retorno do Rei é muito bom mas os dois não fciam pra trás. A Sociedade do Anel tem toda a introdução fundamental pra história. É difícil!