O diretor também aproveita para inserir velhos postulados do gênero: o ataque de índios, a cavalaria, a presença do mítico Wyatt Earp como um dos personagens. É como se, não sabendo se voltaria ao gênero, ele aproveitasse para colocar a mão em todos esses elementos de uma só vez. Todos passam rasantes ao largo da caçada de Lin McAdam a Dutch Henry, o irmão renegado com quem tem contas familiares a acertar, tão fortes que transformam uma caçada até a morte em uma obsessão. A forma equilibrada como Mann insere tantos elementos, e faz o público acompanhar tanto a trajetória dos irmãos como de um inanimado rifle, é um feito. Uma p... lição de como em pouco tempo – não mais do que 90 minutos – todos esses ingredientes possam ser misturados sem tirar a unidade de uma história que é forte em si própria. Não há humor, não há quedas na narrativa, momentos de descanso ou inserções inúteis. A própria menção ao massacre de Custer pelos Sioux é um comentário breve de como velhos clichês poderiam estar mudando, apesar dele não se aprofundar nessa idéia. Tampouco as menções à guerra da secessão, episódios paralelos à maioria dos filmes do gênero que eram pouco mencionados em outras produções – posteriormente, John Ford faria menção ao fazer de seu Ethan Edwards em ~Rastros de Ódio”um veterano derrotado do mesmo conflito. O brilhantismo de “Winchester 73” está em conseguir equilibrar todos esses elementos com uma direção segura e movimentos sempre calculados de câmera que revelam todo o domínio do espaço cênico por parte de Mann. A dobradinha ainda renderia outros momentos memoráveis, mas Mann pôde entregar seu filme com a certeza de ter visitado os elementos clássicos do gênero com uma grande dose de maturidade e muita profundidade. O que veio depois só comprovaria a força do que foi apresentado aqui.
O diretor também aproveita para inserir velhos postulados do gênero: o ataque de índios, a cavalaria, a presença do mítico Wyatt Earp como um dos personagens. É como se, não sabendo se voltaria ao gênero, ele aproveitasse para colocar a mão em todos esses elementos de uma só vez. Todos passam rasantes ao largo da caçada de Lin McAdam a Dutch Henry, o irmão renegado com quem tem contas familiares a acertar, tão fortes que transformam uma caçada até a morte em uma obsessão. A forma equilibrada como Mann insere tantos elementos, e faz o público acompanhar tanto a trajetória dos irmãos como de um inanimado rifle, é um feito. Uma p... lição de como em pouco tempo – não mais do que 90 minutos – todos esses ingredientes possam ser misturados sem tirar a unidade de uma história que é forte em si própria. Não há humor, não há quedas na narrativa, momentos de descanso ou inserções inúteis. A própria menção ao massacre de Custer pelos Sioux é um comentário breve de como velhos clichês poderiam estar mudando, apesar dele não se aprofundar nessa idéia. Tampouco as menções à guerra da secessão, episódios paralelos à maioria dos filmes do gênero que eram pouco mencionados em outras produções – posteriormente, John Ford faria menção ao fazer de seu Ethan Edwards em ~Rastros de Ódio”um veterano derrotado do mesmo conflito. O brilhantismo de “Winchester 73” está em conseguir equilibrar todos esses elementos com uma direção segura e movimentos sempre calculados de câmera que revelam todo o domínio do espaço cênico por parte de Mann. A dobradinha ainda renderia outros momentos memoráveis, mas Mann pôde entregar seu filme com a certeza de ter visitado os elementos clássicos do gênero com uma grande dose de maturidade e muita profundidade. O que veio depois só comprovaria a força do que foi apresentado aqui.
Se a intenção de Welles era mostrar que podia ser comercial, matou a charada e ganhou a aposta, seja ela qual tenha sido, com Spiegel, porque é muito fácil e ligeiro acompanhar a trama de “O Estranho”, sendo capturado de uma cena a outra pela forma ágil com que o roteiro de Anthony Veiller conduz a trama sem perder tempo na construção dos personagens ou explicar mais sobre de que forma Kindler, o criminoso, se tornou Rankin, o professor, e apagou todos os seus rastros. Se essa construção das personagens é rasa, sobra uma encenação metódica de cada ato dessa história. Welles era um mestre em falar pelas imagens, pela composição de cada quadro, pela posição exata da cena e pela forma como ela se movia e interagia de forma quase simbiótica com o ambiente. Em grau menor, é o que ele faz aqui também – e a forma como ele retira de cena o rosto de Kindler – ele próprio – e move a atenção da platéia para o que acontece ao fundo, na porta de uma Igreja que é o epicentro de toda a ação, para depois recolocar Kindler na cena, já na meia hora final, denuncia sua presença. Nas mãos de outro diretor, talvez “O Estranho” fosse alijado de construções de cena como essa, que ocorrem em diversos momentos. A forma como elementos e personagens entram e desaparecem o raio de ação da câmera e se complementam com o resto da construção é maravilhoso. É uma pena que, se começa com pleno vigor e é sustentado por uma interpretação magistral de Edward G. Robinson – Welles, já comentei, exagera em algumas reações – o filme termine de forma tão abrupta após uma meia hora final, com o clímax na torre do relógio, sendo tão brilhante. Chamar “O Estranho” de filme menor só é admitido quando se tem, na filmografia, “coisas” como “Cidadão Kane”, “Soberba” e “A Marca da Maldade” mesmo. Do contrário, é sacrilégio...
( The Stranger, 1946, EUA ) Direção de Orson Welles, com Orson Welles, Loretta Young, Edward G. Robinson, Richard Long, Martha Wentworth
Sob o som do genial Duke Ellington, debaixo dos braços das interpretações de James Stewart , Lee Remick e George C. Scott, sob o olhar de Otto Preminger, pouco importa que o que tanto tenha provocado polêmica em “Anatomia de um Crime” – a menção e discussão de temas como estupro, roupas íntimos, métodos contraceptivos, sexo e a própria sexualidade – hoje soe envelhecido demais para causar impacto, porque a força do clássico de Otto Preminger – que muitos consideram o melhor filme de tribunal de todos os tempos – permanece a mesma naquilo que importa: sua narrativa, e a forma como atrai e prende o público em sua teia. Sobretudo, a maneira como respeita a inteligência do público.
Escrita pelo juiz John D. Voelker, “Anatomia de um Crime” traz James Stewart como um ex-promotor com pouco dinheiro e pouco se lixando para a vida, mais interessado em pescar e descansar, que aceita voltar aos tribunais para defender um tenente do exército acusado de matar o dono de um bar, que teria estuprado sua mulher. Porém, nem o tenente é flor que se cheire – sempre frio, calculista e notadamente ciumento – nem a mulher é a santidade que deveria ser para que o caso tivesse mais chances de sucesso. Só isso já mostraria o quanto “Anatomia de um Crime” investe na falta de nitidez de personagens e situações para confundir o público, mas é ainda melhor.
O filme é sempre dúbio. O final é dúbio. As certezas na mente do público são dúbias, e talvez seja esse o grande mérito desse clássico de Preminger. O público sabe tanto quanto Paul Biegler. E esse dilema básico, inocente ou culpado, é tão habilmente conduzido por Preminger que não é raro que a audiência se sinta dividida quanto a suas opiniões: em dado momento, a atuação do assistente da promotoria geral representado por George C. Scott é tão agressiva e convincente, e Biegler se torna tão inconveniente com nossa busca pela verdade, que percebemos que na verdade não existem lados para os quais torcer em “Anatomia de um Crime”. Existe, isso sim, o lado cujas ações acompanhamos de forma privilegiada, bem de perto.
O clássico de Premminger surgiu de forma oportuna para ajudar a desmontar a imbecil censura imposta nas produções americanas já desde duas décadas antes: vocabulário direto, franco, sem papas na língua – a definição que seria usada no tribunal para o termo “calcinha” origina uma interrupção no julgamento e uma troca de idéias entre o juiz e os dois advogados, para que se tenha idéia dos tempos hipócritas que se viviam nos Estados Unidos dos anos 50, sob a regulação do conservador Código Hays, que tornou Hollywood um lugar inocente – até demais – nos anos 30 a 50. (Em todo esse contexto, é memorável também a participação do juiz Joseph N. Welch, interpretando o próprio juiz que preside o caso: foi Welch quem colocou em seu devido lugar o Senador Joseph MaCarthy, que conduziu a perseguição comunista na América na década de 50, e entrou para a história ao encarar o senador e lhe perguntar, sem papas na língua: O Senhor não tem vergonha?)
Preminger, como de costume em seus bons tempos, emite seus julgamentos de sentido em alguns momentos, de forma tímida, mas reveladora. A lata de lixo que aparece nos momentos finais, e tudo o que é dito em frente a ela dá uma indicação do que ele apontaria como verdade absoluta da história, a sua noção de caráter e moralidade. Dúbia, como o resto do filme, ou pelo menos livre para entendimentos: o público formula o seu.
(Anatomy of a murder, EUA, 1959 ) Direção de Otto Preminger, com om James Stewart , Lee Remick , Ben Gazarra , George C. Scott 160 minO brilhantismo com que Brian DePalma nos conduz na história de Carrie White é tão perverso quanto poderia ser uma adaptação de um romance de Stephen King, mas o terror em “Carrie, a Estranha” não vem do medo do desconhecido, de criaturas sobrenaturais ou mesmo do banho de sangue que ela entrega na palma da mão do espectador na climática seqüência do baile. O terror no filme de DePalma vem do fanatismo religioso e do preconceito. São esses dois elementos que causam repulsa e ódio, e alimentam, pouco a pouco, um sentimento tão dúbio no espectador que, quando Carrie arregala seus olhos de forma demoníaca, coberta de sangue, há um certo júbilo da platéia. Ela queria isso, tanto quanto Carrie. Ela queria ver a menina ridicularizada pelos colegas de escola e imersa em um inferno dentro de sua própria casa se vingar de todos – e sequer as pessoas que se importavam com ela conseguem se livrar de sua fúria demoníaca. E essa é outra face do terror psicológico de “Carrie”: a platéia quer ver sangue.
Adaptado do primeiro romance de sucesso de King, “Carrie” se apóia de forma magistral em duas atuações: a de Sissy Spacek, genial como a garota introspectiva, de cabelos divididos, postura amedrontada e gestos nervosos, e principalmente de Piper Laurie como sua mãe, fanática religiosa. Mais do que os colegas, é ela a responsável pelo banho de sangue que a menina, que possui dons telecinéticos, promove no Baile de Formatura. Mesmo que o fanatismo não cegue a menina, que sonha em interagir com seus colegas e sabe que o dom que possui não é uma manifestação do demônio, uma vida inteira criada dentro dos costumes castradores da mãe alimentam a explosão dos poderes ocultos da menina, que é ridicularizada no Baile.
Rever “Carrie” com atenção mostra um domínio invejável de DePalma sobre o tema ao qual se debruça. Ele alterna momentos tocantes e idílicos com abruptas intervenções no clima da cena, de forma tão brusca que levam o espectador de um lado a outro de sua percepção. O inocente banho é repentinamente interrompido pelo terror de Carrie com a primeira menstruação em um vestiário repleto de garotas prontas a ridicularizarem-na. A expectativa de um garoto, circundando as árvores em planos alternados de câmera, atrás de Carrie, é interrompido abruptamente pela manifestação rápida dos seus poderes. Na sua primeira aparição, a câmera sobrevoa a quadra do colégio para repousar, candidamente, no rosto de Carrie, na primeira manifestação de sua pouca popularidade. E toda e qualquer manifestação dos poderes ocultos da jovem surgem em momentos rápidos, que estouram sob um único acorde da trilha de Pino Donaggio – trilha, aliás, exemplar, que bebe na fonte de Bernard Herrmann mas consegue alternar os acordes assustadores com momentos tocantes.
E a construção do horror adolescente, em suas várias faces, atinge seu auge estilístico na seqüência do baile: A transformação da jovem, de Rainha do Baile para Rainha da Morte, quando Carrie, coberta de sangue, exibe seus olhos abertos e frios, sua expressão sem emoção, quando as portas se fecham, e a tela se divide em duas para mostrar a reação do público apavorado e as expressões de Carrie, apenas contemplando a destruição que promove. Já seria digno de constar em um dos grandes momentos da carreira de DePalma – que ensaia os momentos de slowmotion e antecipação que retomaria com tanto brilhantismo posteriormente na seqüência em que Amy Irving prevê o que está para acontecer mas tenta, sem sucesso, impedir. A força dos grandes olhos de Sissy Spacek mesclados com o vermelho que cobre seu rosto são assustadores e DePalma volta a trazer o espectador para o outro lado da moeda quando ela retorna para casa, apenas para, novamente, girar o botão novamente em uma seqüência que atesta toda a repulsa do público para com a figura da mãe. Essa capacidade de trabalhar tão bem o terror de forma não gratuita e constante coloca o filme de DePalma como um dos grandes momentos do gênero.
(Carrie, EUA, 1976 ) Direção de Brian DePalma, com Sissy Spacek, Piper Laurie, Amy Irving, William Kat, Nancy Allen, John Travolta. 98min(Sink the Bismarck, EUA, 1960 ) Direção de Lewis Gilbert, com Kenneth More, Dana Wynter, Carl Mohner, Laurence Naismith, Karel Stepanek, Maurice Denham, Geoffrey Keen, Michael Hordern, Esmond Knight, Edward R Murrow