Juno

Escrito por Fábio Rockenbach

(Juno - EUA - 2007 )
Direção de Jason Reitman, com Ellen Page, Michael Cera, Jason Bateman, Jennifer Garner, JK Simmons.


"Vocês deviam ir para a China, sabe? Parece que lá eles estão distribuindo bebês como distribuem Ipods..."
Quando soube da indicação de "Juno" para melhor filme no Oscar 2008, a primeira imagem que me veio à mente foi "Pequena Miss Sunshine". Se "Juno" tivesse metade do brilho de "Sunshine..." já valeria a entrada - o que dizer então quando a direção é de ninguém menos de Jason Reitman, também indicado ao Oscar, que havia entregue anteriormente o ótimo "Obrigado por Fumar?"Quando terminei de assistir ao novo filme de Reitman, fiquei um pouco confuso. Ao mesmo tempo que retrata personagens com comportamento muito reais, também banaliza algumas reações. "Juno" trata de um tema batido de forma nova. Não pelo ponto de vista ou pelas situações que mostra, mas pela FORMA como faz isso. Não lembro quando foi a última vez que adolescentes foram retratados sem os clichês e estereótipos próprios do cinemão americano.

Juno MacGuff é uma jovem de 16 anos que se descobre grávida do melhor amigo, Bleeker, caladão, recluso, tímido e, para os padrões de muitos colegas, esquisito. O brilhantismo do roteiro de Diablo Cody ( outra indicada ao Oscar ) está em conseguir manter a atenção em uma história que pode ser resumida em uma linha: Juno procura um casal para ficar com o bebê depois que ele nascer. Tudo gira em torno desse argumento simplíssimo, atores em estado de graça e uma trilha sonora descolada - prepare-se para músicas de Lou Reed, David Bowie, The Moldy Peaches e outros, embalando um show de diálogos impagáveis.
Sarcasmo, ironia e humor negro já são uma marca registrada do cinema de Reitman. Aqui, somente o último ingrediente aparece em doses menores. Está nos diálogos cortantes e na personalidade magistralmente construída de Juno pela jovem Ellen Page ( a quarta indicação ao Oscar do filme ) o humor inteligente que conquistou tanto ao público e à crítica. Ao tratar o tema da gravidez na adolescência sem falsas lições de moral ou mensagens batidas, o roteiro de Cody opta por mostrar de que forma uma adolescente real reagiria a uma situação dessas - ou nem tão real, já que Juno encara a gravidez de uma forma, digamos, "cool". Essa personalidade da protagonista, ao contrário do que muitos pregam, não é fácil de ser construída. Juno é independente, esquisita e sem vergonha de falar o que pensa mas, por outro lado, também tem suas neuroses de jovem, como o medo do que os outros pensariam de saber que ela está apaixonada pelo estranho Bleeker - algo que ela mesma evita admitir. De uma forma que parece assustadoramente natural, Page dá vida a essa personagem de uma maneira que eclipsa todos os que estão ao seu redor - incluindo Jennifer Garner, que mesmo sem ser grande atriz, dá conta do recado no papel contido que recebeu de Reitman. Não que haja furos no elenco: todos estão bem, mas passam rasos próximos à Page - que até então era mais conhecida como a Kitty Pride de "X-Men 3". Uma pequena exceção pode ser feita a Michael Cera, que aqui brilha muito mais do que na superestimada comédia "Superbad", de Judd Apatow.É curioso, também, como Reitman subverte alguns personagens para mostrar que, mais importante do que a idade, são os elos comuns e os interesses que unem as pessoas. Os futuros pais do bebê de Juno, Mark e Vanessa, são um exemplo: é com a jovem de 16 anos que Mark se identifica mais, a ponto de repensar o próprio casamento, afinal, a esposa o sufoca reprimindo suas grandes paixões: filmes e música, que ele curte somente quando está sozinho.
Apesar das boas risadas, o filme ganha mais equilíbrio na metade final, quando abandona a vontade de ser engraçado e ganha consistência como drama. Mas se há um defeito em "Juno" é a superficialidade com que Reitman trata do tema da gravidez na adolescência, dando à protagonista uma frieza que dificilmente se encontraria na vida real com uma adolescente de boa instrução e mente fresca. Se formos considerar que no seu filme anterior Reitman também brincou com assunto sério, pode-se considerar recorrente em sua carreira. O diretor gosta de usar do cinismo e da hipocrisia em seus discursos, sejam sérios ou engraçados. Tira dessa informação sua conclusão a respeito dessa história sobre personagens estranhamente comuns, mas não busque moral da história: Reitman gosta de criticar a moral, e não pregá-la.

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